A
Rússia prepara-se para ter servidores de internet isolados, como
forma de cibersegurança contra ameaças externas.
Em Moscovo, a 11 de abril de 2019, foi aprovada uma lei pela criação de uma “internet soberana”, uma ideia que já vinha a ser debatida pelo
governo russo. A ideia de uma internet isolada levanta questões como a
soberania do país e a própria intromissão em assuntos internos, por atores
externos, através de fake news. Sendo
a Rússia um país comumente acusado de produção de desinformação para o
ocidente, esta questão é também vista como uma ameaça para o leste, apontando os
Estados Unidos como interferência. Note-se a repulsa russa pela interferência
ocidental, que levou Putin a considerar a internet como um “CIA
project”.
O objetivo principal desta análise prende-se com discussão sobre esta
opção tomada pela Rússia. Pensar numa internet soberana a um país é pensar
também na possível censura governamental sobre o conteúdo disponibilizado. Mas
é também pensar numa forma de segurança e soberania nacional.
Pergunte-se: será que a internet deve ser uma plataforma global ou
isolada, de forma a combater as fake news
inimigas? Cada vez mais, a internet e a desinformação transformam-se nas
mais poderosas formas de afetar um estado. A cibersegurança e a integridade
estatal estão em jogo e, por isso, será normal existirem diferentes soluções
para a contenção deste dilema. Não obstante, torna-se necessário discutir sobre
a legitimidade dos métodos para esse fim.
Primeiro, há que considerar que esta tentativa de isolar a internet e,
consequentemente, o controlo da informação que chega aos cidadãos, não é
inédita. Aliás, o sistema chinês atual de internet aproxima-se da proposta do
governo de Putin. China e Rússia, com tantas semelhanças, especialmente nas
opções políticas, convergem aqui com uma ideia similar com objetivos iguais. Tanto Moscovo como Beijing temem influência
externa: por um lado, Moscovo
aposta na nacionalização da internet; por outro lado, Beijing censura conteúdos
no sistema existente.
Note-se
ainda que esta decisão não teve o consenso da população. De facto, a 10 de
março de 2019, protestos contra o fim da internet livre levaram milhares
de russos ao centro de Moscovo. Também
em Voronezh
e em Khabarovsk foram autorizados protestos, enquanto
que em São
Petersburgo os protestos não foram autorizados,
o que não impediu alguns ativistas de se manifestarem nas ruas. Para aqueles
que protestaram, slogans como “Save
the Internet, Save Russia”, “Isolation—It’s Death” e “NO to Digital Enslaving” marcaram este dia e a vontade clara de manter a Rússia na partilha do
mesmo sistema de internet global.
Quanto à medida em
si, é necessário compreendê-la para perceber as posições a favor e contra. Esta
lei, que surgiu primeiro como projeto lei intitulado “Programa Nacional de
Economia Digital”, determina que “data
from its own organisations and users would remain within Russia, rather than being
distributed globally.”. Assim, a Rússia
pretende testar o corte da sua internet ao sistema global, de forma a que, em
caso de um ataque à sua cibersegurança, possa subsistir autonomamente, contra
forças externas.
Para o Kremlin, esta lei é
uma clara luta contra a intromissão de atores externos nas questões internas da
Rússia. Assim, esta lei veio acompanhada de uma primeira, aprovada em março,
tornando crime “to
publish “fake news” or “disrespect of the authorities” on social media”.
Para os críticos, como os
media russos,
veem uma nova forma de “cortina de ferro”, em que o país se fechará, novamente,
do resto do mundo – uma forma também de contenção de possíveis revoltas ou
revoluções no seio da sociedade russa. Sergey
Ivanov, deputado do Partido Liberal Democrata da Rússia, é também crítico,
afirmando: “We
are categorically against the fact, that the state gains full control over all
messages of citizens, as it is written in the draft law,”.
Para Artem Kozlyuk, diretor da RosKomSvoboda, uma ONG pelos direitos digitais
russos: “The
“creation of a ‘red button’ that gives the state more ways of disconnecting the
country from the global network,”, é a questão mais
preocupante, referindo-se a uma separação Rússia/resto do mundo.
Em suma, o problema deste
isolacionismo consiste no equilíbrio entre a proteção de informação estatal
(segurança) e a censura de conteúdos aos cidadãos (liberdade). Comparando a
resposta da UE e da Rússia perante as fake
news, a Rússia opta pela nacionalização e assim revisão de todos os
conteúdos, contendo nacionalmente e isolando a internet em caso de ataque por
atores externos. Já a UE, optou pela fiscalização e eliminação de conteúdos que
desinformem, apostando também na consciencialização
dos cidadãos.
Na realidade, estas
respostas baseiam-se na censura de conteúdos, sendo que um preza pela filtração
num sistema global e o outro pelo isolamento. Assim, será mais importante a
segurança ou a liberdade? Acredito que liberdade de informação, de expressão e
a importância de ter variedade de conteúdo/fontes não podem nunca ser
esquecidas nesta luta contra leaks,
desinformação e ataques externos à cibersegurança.
Imagem utilizada para ilustrar esta análise.
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