O Iraque e a rivalidade entre os EUA e o Irão


Tem havida uma constante na política iraquiana desde a invasão dos EUA em 2003: quanto mais forte o antagonismo entre os Estados Unidos e o Irão, mais fraco o governo iraquiano se torna. A competição entre os dois principais financiadores externos do Iraque polariza a sua política e paralisa as operações do dia-a-dia. Hoje, com as tensões entre Teerã (capital do Irão) e Washington em ascensão, o Iraque mais uma vez poderia ser um campo de batalha político e físico, perturbando o seu frágil equilíbrio interno e aprofundando a turbulência regional.
Em 2005, o Iraque foi engolido por conflitos sectários: Milícias xiitas estavam a atacar as tropas dos EUA; e uma insurreição baseada em sunitas, liderada por uma afiliada local da Al Qaeda, estava a lutar contra a força de ocupação e dos seus aliados iraquianos. Em resposta, Washington lançou uma medida: uma injeção de tropas extras com o objetivo de derrotar ambos os insurgentes e estabilizar o país. Esse esforço foi militarmente bem-sucedo, mas pouco ajudou a criar um governo mais funcional.
Quando os Estados Unidos retiraram as suas tropas do Iraque em 2011, o governo iraquiano aproximou-se do Irão, dependo cada vez mais do Irão para combater a oposição interna, que cresceu na turbulência desencadeada pela revolta síria e pela guerra civil que se seguiu. Enquanto as forças de segurança do Iraque permaneciam fragmentadas e paralisadas pela corrupção, a rede jihadista do Iraque reorganizou-se na Síria, tornando-se o Estado Islâmico. Este grupo retornou ao Iraque em 2014, aproveitando grandes áreas do país.
Durante esse período, Teerã e Washington encontraram maneiras de coexistir e até mesmo de cooperar tacitamente no Iraque, especialmente, no que diz respeito ao esforço para derrubar o Estado Islâmico. A conclusão bem-sucedida do acordo nuclear em 2015, reduziu as tensões entre Teerã e Washington e criou condições para a coexistência estratégica na região, da qual a luta contra o Estado Islâmico foi um exemplo.
Porém, quando o Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump,se retira do acordo nuclear com o Irão e lança uma campanha de “pressão máxima” de sanções, qualquer relação que tenha existido entre eles para derrotar o Estado Islâmico desaparece.
A batalha EUA-Irão é agora principalmente sobre as sanções dos Estados Unidos, que Washington está a tentar aplicar em todo o mundo, inclusive no Iraque. Os Estado Unidos sabem que levará anos até o Iraque ter independência energética, porém estão a colocar uma enorme pressão no governo para reduzir a sua dependência energética do Irão a curto prazo.  O Irão teria de fazer isso importando eletricidade de países que não o Irão, como a Jordânia, teria também de melhorar a distribuição de energia elétrica através de infra-estruturas construídas por empresas estrangeiras.
Portanto, a administração Trump não está apenas a procurar o cumprimento das sanções por parte do Iraque, mas também organizar o apoio do Iraque contra o Irão, usando a ameaça de encerrar empréstimos e de reter fundos de estabilização para esse fim.  Por mais sanções secundárias dos Estados Unidos possam ferir o Iraque, a noção de que a cooperação económica entre o Iraque e o Irão terminará, é uma ilusão. Nos últimos 16 anos, os iranianos integraram deliberadamente a economia iraquiana, e não estão dispostos a desistir dos seus investimentos.
O governo iraquiano não se pode dar ao luxo de esperar por uma mudança de rumo na escalada do EUA-Irão ou no fim do governo Trump. Nem pode pagar as sanções dos Estados Unidos ou cortar as suas importações de energia do Irão.
O Iraque também poderia diversificar as suas relações económicas e de segurança com os países ocidentais, trazendo mais interessados da União Europeia, que permaneceram em grande parte neutros na rivalidade entre os Estados Unidos e o Irão. E o Iraque poderia gradualmente diversificar a sua cooperação estratégica em questões de segurança ao negociar um acordo com Washington segundo o qual, as tropas dos Estados Unidos permaneceriam no Iraque exclusivamente sob o comando de forças multinacionais, enquanto os estados membros da UE assumiriam as atividades de assessoria e de treinamento que os Estados Unidos fornecem atualmente.
Diante das sanções dos Estados Unidos no irão, os países membros da EU desfrutam de alto grau de consenso sobre a política do Iraque. Enviar uma delegação de alto nível da União Europeia ao Iraque ajudaria a sinalizar a determinação da Europa em continuar a tratar o Iraque como um parceiro privilegiado.
 A estabilidade atual do Iraque - com uma queda acentuada na violência nos últimos dois anos - é real, mas frágil. Os líderes iraquianos tentaram, em diferentes fases, diversificar a política externa do Iraque, mas a luta interna pelo poder dentro e entre os partidos políticos sempre os empurrou de volta à dicotomia EUA-Irão, tornando o país vulnerável a mudanças de poder externas.



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