Repetição do Apartheid Sul-Africano em Israel: o desinteresse europeu



O que está agora a acontecer em Israel não está muito longe do dia-a-dia da população sul-africana entre 1948 e 1994, não só em termos políticos mas também quanto à brutalidade da situação. A guerra Israel-Palestina tem proporcionado momentos e medidas relativamente semelhantes – senão mesmo iguais – às do apartheid, e todos sabem disso: Israel chegou mesmo a aceitar esta questão e a introduzi-la no seu debate político, os EUA começam também a inteirar-se deste assunto, com o surgimento de organizações internacionais como a Jewish Voice for Peace. Apenas os Estados europeus optam por negar a existência de um novo ciclo de apartheid por parte de Israel contra os cidadãos palestinianos, embora não faltem evidências que o comprovam.

As restrições de Israel à liberdade nos territórios palestinianos ocupados são um regresso aos tempos das leis sul-africanas, que criminalizavam os negros sem autorização para entrada ou saída de uma determinada cidade onde a maioria da população era branca. As medidas impostas por Israel que provocam uma remoção populacional palestiniana forçada e a destruição de milhares de casas leva-nos aos tempos em que cidadãos negros eram forçados a sair das suas casas para a ocupação “branca”. No caso israelita, as forças armadas escolhem métodos de tortura e brutalidade, o que excede em larga escala o que aconteceu na África do Sul.

            É um facto que existem diferenças, uma vez que os fatores históricos, geográficos ou religiosos são diferentes; no entanto, segundo a definição universal do conceito de “apartheid”, ambos os casos são, efetivamente, situações de segregação social. De acordo com o Direito Internacional, o apartheid é um regime aplicado por um Estado, de discriminação e opressão racial institucionalizada e legalizada, por um grupo racial maioritário contra um outro minoritário. Em comparação, a segregação israelita é mais militarizada e violenta, já que na África do Sul não havia a morte de manifestantes – tal como Israel tem vindo a fazer na faixa de Gaza.

            Todos conhecemos a repressão aplicada ao povo palestiniano por parte do Estado israelita para a ocupação de territórios por parte deste, assim como a recente criação de uma divisão legal – e desigual - para quem é palestiniano e para quem é israelita. Neste sentido, qual é o motivo pelo qual os Estados europeus recusam a existência do apartheid na Palestina? Analisando a situação, vemos que não está a ser aplicado a Israel o mesmo grau de sanções que foi aplicado à África do Sul no século passado. O festival Eurovisão será realizado em Telaviv, continuam os negócios com Israel, nomeadamente armas - apesar dos crimes que são cometidos com as mesmas -, são mantidos laços culturais e educacionais… No caso sul-africano, as sanções europeias foram aplicadas e aceites na sua generalidade; no caso israelita, está a ser feito de tudo por determinados Estados europeus para a obtenção da criminalização do movimento social não-violento “BDS - Boycott, Divestment and Sanctions”, cujo objetivo é a conquista da liberdade, da justiça e de direitos iguais para o povo palestiniano.

            Existem três possíveis explicações: em primeiro lugar, os lobbies favoráveis à ação israelita sitiados em vários países europeus são tão ou mais eficazes quanto os que se encontram nos EUA; em segundo lugar, o Holocausto, onde as políticas de alguns países, como por exemplo a Holanda, ainda mostram a culpa no fracasso do salvamento de milhões de judeus durante a Segunda Grande Guerra; e por último, o medo de ficarem conhecidos como anti-semitas, já que o conceito de anti-semitismo foi alargado para abranger as críticas ao apartheid israelita.

            Enquanto que na África do Sul o então Presidente Pieter Willem Botha foi odiado porque aplicou medidas que intensificaram o apartheid, e não propriamente por ser “Afrinaker” – descendente de colonos europeus residentes na África do Sul -, em Israel a situação assemelha-se, uma vez que o Primeiro-ministro Benjamin Netanyahu é odiado por aplicar medidas favorecedoras de segregação social e não por ser judeu. Esta situação acaba por se tornar cada vez mais confusa para a Europa, dado que, atualmente, criticar o governo de Israel pelas medidas sociais aplicadas contra a Palestina é visto como anti-semitismo, enquanto que durante o apartheid sul-africano, as críticas europeias ao regime eram populares – provocaram o surgimento do Movimento Anti-Apartheid, que defendia o boicote a serviços e relações com entidades sul-africanas, sendo este movimento muito apoiado.

            Assim, até que os Estados europeus tenham a coragem de distinguir as críticas a Israel por aplicação de medidas repressivas e favorecedoras do apartheid, este continuará a crescer na Palestina, havendo, uma certa cumplicidade e culpa da Europa. Já na Palestina, o sentimento anti-semita continuará a aumentar até que a ocupação israelita tenha o seu fim. A Europa não deve pôr-se de parte nesta questão por medo de rótulos. É preciso que a Europa consiga perceber o verdadeiro significado de anti-semitismo e entender que estar contra determinadas medidas de um país, apesar deste ter população judaica, não torna os países europeus anti-semitas, mas sim defensores da igualdade social.

Fonte do cartoon: https://desertpeace.wordpress.com/2018/07/22/israel-is-officially-divided-by-law/

Mª Inês Jorge, nº221468

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