Eleições na Ucrânia: O comediante que não faz rir o ocidente – e será que devia fazer?




As eleições presidenciais na Ucrânia, que ameaçaram ser adiadas pelos conflitos no seu território, vão ditar se o futuro é mais para ocidente ou para leste.

A 31 de março de 2019, deu-se a primeira volta das eleições presidenciais na Ucrânia, sendo que só se saberá quem será o próximo presidente ucraniano após a segunda volta (marcada para 21 de abril de 2019). Observando os resultados da primeira volta, Volodymyr Zelenskiy conta com 30.24%, ultrapassando o atual presidente Petro Poroshenko (15.95%). A decisão sobre o novo presidente terá impactos na política internacional, o que levou à tomada de partidos pela UE e pela Rússia.
O objetivo principal desta análise prende-se com a comparação das escolhas de apoio aos candidatos ucranianos, por parte da UE e da Rússia. De facto, considerando os conflitos Rússia/Ucrânia em território ucraniano, o país enfrenta grandes dificuldades em conseguir uma liderança forte e assegurar a manutenção da sua soberania.
Com o estabelecimento da lei marcial (que, como por tempo limitado, não afetou a concretização das eleições presidenciais) e com o país com os problemas ligados à envolvência num conflito armado em território nacional, a escolha do novo presidente é crucial para o futuro da Ucrânia. Contudo, esta escolha parece estar mais associada, nos media, a atores externos (UE e Rússia) do que à própria Ucrânia – será isto uma forma de intromissão nos assuntos internos?
Em primeiro lugar, torna-se necessário fazer uma pequena contextualização. Na verdade, o atual presidente não chegou ao poder de forma “comum”. Com isto quero dizer que, Petro Poroshenko subiu ao poder após eleições a fevereiro de 2014 (após a Revolução de 2014) que derrubou o governo de Viktor Yanukovych. A governação Petro Poroshenko foi definida por estar muito ligada à UE e afastar-se da Rússia. Daí algumas das políticas implementadas como, por exemplo, o acordo com a UE de forma a existir viagens sem necessidade de visto entre UE e a Ucrânia. Além disto, há que mencionar a separação da Igreja Ortodoxa Ucraniana, ganhando independência da Russa. Contudo, alegações de corrupção, o estado da economia ucraniana e a continuação do conflito armado fez com que muitos ucranianos procurassem outras opções na altura de voto.
Para a UE, Petro Poroshenko parece ser o menor dos males. O presidente que antes era criticado, pelas suas reformas lentas na Ucrânia, é o candidato favorito do ocidente de forma a contrariar a Rússia. É por isso que o ocidente acredita que a Rússia tenta campanhas no sentido desinformação (veja-se um relatório dos serviços de informações norte-americanos sobre desinformação russa na Ucrânia: “exploit Kyiv’s fragile economy, widespread corruption, cyber vulnerabilities, and public discontent.”). Note-se, é claro, que todas as análises são parciais e, por isso, pode até ser questionada a legitimidade dos EUA neste tópico, sendo a Rússia um inimigo antigo.
Quanto a Poroshenko, fez uma campanha de forma a ilustrar que ele é a única hipótese contra o controlo de Putin (“It’s either me or Putin”). Afirmou: “[Putin] dreams of a soft, pliant, tender, giggling, inexperienced, weak, ideologically amorphous and politically undecided president of Ukraine. Are we really going to give him that opportunity?”, tentando contrariar o apoio a Zelenskiy.
Para a Rússia, é importante um presidente flexível como Volodymyr Zelenskiy. Na verdade, para Putin é crucial que ganhe ou Zelenskiy ou Yulia Tymoshenko. Isto porque tanto um como outro, na visão do Kremlin, quebrariam as relações com o ocidente e especialmente com o FMI, o que daria espaço para maior influência russa. Nada disto acontecerá se a vitória for para Poroshenko.
Note-se, a afirmação de Zelenskiy: “I’m not used to crashing a party to which I wasn’t invited”, falando na possibilidade de se referendar a entrada na UE e na NATO. De facto, é necessário compreender que Zelenskiy representa todos os ucranianos russófonos que se sentiram abandonados com as políticas de “ucranização” de Poroshenko. Mais, este candidato diz estar disposto a entrar em negociações com Putin sobre Donbass.
Atualmente, somam-se os escândalos de corrupção e a grave situação económica na zona leste. Por isso, é natural concluir que um líder (que fala russo e ucraniano) que promete união da Ucrânia, paz e estabilidade, traz uma mensagem forte, que se refletiu no sentido de voto.
Em suma, acredito que, quanto a estas eleições presidenciais, é perigoso atores externos tomarem posições. A não intromissão nos assuntos internos e a autodeterminação dos povos deve ser sempre central (abrindo-se um precedente se se tratar de violações dos Direitos Humanos).
Existe um esforço contínuo de combate à desinformação por parte do ocidente, contra a Rússia. Contudo, nestes casos é difícil de ser se imparcial, sendo que o contrário poderia ser apontado pela Rússia ao ocidente, dizendo que são as fontes ocidentais as que deturpam informação.
Por isso, será que a UE deveria pronunciar-se sobre as eleições ou, por outro lado, evitar a influência, mantendo-se neutral, de forma a que a Ucrânia possa ter, dentro do possível uma escolha mais livre?

Na imagem utilizada para ilustrar esta análise pode ver-se, da esquerda para a direita: Petro Poroshenko e Volodymyr Zelenskiy, os dois candidatos mais votados à presidência ucraniana.

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